Fotos: Vlademir Alexandre
As perdas são muitas e constantes, e apesar de o medo universal ser mesmo a morte - para os psicanalistas, ela dá sentido à vida e, também, origem a todos os outros medos - não é sempre dela que vem o maior sofrimento.
"As pessoas sentem de forma diferente. A dor depende de quem é o indivíduo, de como ele vivencia a própria vida, de como foram as outras perdas, de sua história, das suas relações, do que significa a coisa perdida e da forma como a perda aconteceu", explica a psicóloga Milena Câmara, que se especializou em psicologia do luto.
Assim, uma mulher pode lamentar mais uma separação que a perda do filho e alguém pode sentir mais alívio que dor quando morre alguém de quem precisou tratar a doença por muitos anos.
Milena Câmara é uma das poucas pessoas do Brasil a se interessar por tanatologia, a ciência que estuda a morte, e implantou em Natal o primeiro serviço de psicologia do luto dentro de um cemitério do país, há seis anos.
Embora a palavra luto remeta à morte, para a psicologia ele é o tempo que uma pessoa leva para elaborar as perdas, quaisquer que sejam elas. "É um tempo para se adaptar às ausências. É como se o mundo da gente mudasse de uma hora para outra: eu tinha, e agora não tenho mais. Isso remete à idéia de finitude e de morte", continua Milena Câmara.
A passagem pelo luto acaba quando são cumpridas quatro tarefas, nessa ordem: aceitar a perda; se permitir sentir tudo o que for preciso - tristeza, raiva, alívio; ajustar-se ao ambiente em que falta a coisa perdida; e, por fim, reinvestir a emoção em outras pessoas ou coisas. Para todas as etapas, um fator é fundamental: a disponibilidade de tempo.
"É importante que você reconheça que precise de um tempo para sofrer, e que esse tempo é relativo. O mundo lá fora é muito cruel. As pessoas dão um tempo determinado para a dor. Até a gente dá", diz a psicóloga. Atropelar o processo de luto faz com que as emoções fiquem contidas, para aparecerem anos depois, ou logo, sob forma de doenças.
"A gente não foge da gente", avisa. A cronologia estabelecida pela sociedade é conhecida: a pessoa deve ficar muito mal do enterro à missa de sétimo dia. Depois disso, é hora de trabalhar e voltar a viver. Aos pais que perderam um filho, são dados três dias de licença no trabalho.
Caso a morte seja "apenas" de outra pessoa da família, é concedido um dia de folga. As outras perdas, como separação, por exemplo, não são consideradas. Grande vilã da era moderna, a falta de tempo também influencia negativamente no preparo para a perda.
É por falta de tempo que os pais delegam a criação dos filhos às babás e é por não se ter tempo que as perdas são substituídas por compensações, como brinquedos, roupas e viagens. "Os valores estão diferentes. Isso tem a ver com o sistema capitalista, com o consumo, a era das aparências.
As crianças são criadas como reizinhos, como príncipes, mas os pais não trabalham muito os sentimentos das crianças porque não dá tempo", opina a psicóloga Ana Elisa de Castro, que trabalha no serviço de luto do Grupo Vila, administrador do cemitério Morada da Paz.
Ela atende os familiares enlutados que requisitam o serviço e também faz aconselhamento virtual no site do Grupo, respondendo e-mails, escrevendo artigos e indicando livros e filmes que falem sobre perdas. Muitas vezes, também é chamada para agir no próprio velório.
A decisão de solicitar ajuda depende apenas da própria pessoa e não existem regras como quantidade de tempo para superar o luto. "Em linhas gerais, a pessoa deve procurar um psicólogo quando está muito difícil continuar a vida", explica Castro.
E o que fazer para consolar alguém? "Ofereça sua presença, seu apoio, e não queira usar compensações. Também não fique comparando com a sua dor, fazendo competição de sofrimento", orienta Milena Câmara.
Também evite "pérolas" como "vestibular tem todo ano", "ele foi para um canto melhor" ou "pior que separação é a morte": "A pior dor é a sua e a do momento."
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